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Uma Parábola: Pergunta Noturna

O que estou fazendo de errado? — A pergunta nunca esteve muito distante da mente da mulher. Nesta noite, ela gritava das profundezas do seu íntimo, exigindo a resposta que nunca veio.

– Veja minha vida. As coisas não estão saindo como eu esperava. Por que não me sinto melhor a respeito de mim mesma? Por que a vida é, às vezes, tão difícil? Devo estar fazendo algo muito errado.

A mulher não acreditava que estava sendo castigada por uma divindade vingativa por causa de erros cometidos, embora esse pensamento fosse, às vezes, difícil de afastar. Ela cria, porém, que havia uma maneira certa de viver, que facilitaria as coisas. E claro que havia. Mas, até agora, não conseguira encontrar o caminho.

Aqui em casa, à noite, era mais difícil do que nos dias ocupados fingir que estava satisfeita, que Deus a abençoara o suficiente para que ela pudesse chamá-lo de bom. Na solidão que sufocava sua alma, as lembranças voltavam – tempos em que se sentira viva, feliz e boa, e as ocasiões em que se sentira muito mal.

Essas lembranças voltavam com freqüência, especialmente depois do cair da noite, e ao longo do tempo moldaram sua visão do que almejava de melhor na vida, das bênçãos pelas quais estava disposta a lutar e, portanto, esperava que recaíssem sobre sua vida. A mulher ansiava por sentir novamente a alegria que conhecera antes e também evitar o sofrimento do qual não podia se esquecer. Sabia o que desejava… mas não conseguia encontrar o caminho. Sua vida era disfuncional.

–  Obrigada, Deus — a mulher se obrigou a orar enquanto se enfiava nas cobertas. — Sei que vai me levar para o céu quando esta vida terminar. Obrigada pelo dom da vida eterna, que eu nunca poderia alcançar por mim mesma. Sei que tem um plano para mim agora, antes que eu vá para o meu lar. Vou confiar que ainda será possível pô-lo em prática.

Antes de o sono chegar, ela acrescentou: — Qual o obstáculo que estou criando? O que estou fazendo de errado?

Na escuridão silenciosa do quarto, a mulher esperou. Deus certamente responderia à sua pergunta e lhe mostraria o que fazer para receber as bênçãos de uma vida melhor agora, as bênçãos que, com toda certeza, Deus pretendia que o seu povo desfrutasse. — Eu faria tudo que fosse preciso… se apenas soubesse o que é. — Esse foi o seu último pensamento antes que o sono a resgatasse da pressão de imaginar o que seria.

Quanto tempo depois aconteceu, ela nunca soube. De repente, sentou-se na cama, completamente acordada, mas de maneira diferente do que quando o despertador tocava. Este despertar foi novidade. Se tivesse olhado para o relógio ao lado do leito, teria visto o mostrador brilhar com quatro zeros. Entrara num mundo além do tempo.

A voz não a despertara, porém ela a ouviu claramente: —Vim para mostrar-lhe o novo caminho.

Quem estava ali? Quem falara? Não conseguia ver ninguém. Se houvesse um corpo por trás da voz, ela não conseguiria vê-lo. A escuridão era total.

– É um sonho – disse para si mesma. Deitaria de novo e tudo sumiria.

A voz falou outra vez no mesmo tom nítido. — É a sua hora. Vim para mostrar- lhe o novo caminho. Está suficientemente escuro agora para que possa ver.

Isto não é um sonho, pensou a mulher. –  Estou contente que veio — disse ela em voz alta. — Preciso desesperadamente encontrar um novo caminho. Orei muito para saber como melhorar a minha vida. Nada que tentei até agora deu certo. Preciso descobrir o novo caminho de que está falando.

– Você está procurando outra versão do antigo caminho. Vim para mostrar-lhe o novo caminho.

A mulher ficou intrigada, mas não silenciou. — Concordo que há muitos meios que não funcionam. Minha vida é uma prova disso. Tentei tudo o que podia para mudar o modo como me sinto para melhorar minha vida. Por favor, se tem qualquer misericórdia, mostre-me o que estou fazendo de errado que me impede de ser o que tanto desejo. Estou pronta para aprender um novo caminho. E para isso, serei uma discípula obediente.

– Você procura um método para fazer a vida funcionar. Esse é o velho caminho. — A voz mostrava paciência, como a voz de um avô ensinando o neto enquanto caminham juntos. — Qualquer método que escolher se torna o seu senhor. Você serviu a muitos senhores em sua vida, mas o seu alvo se manteve constante. Você não quer nada além da vida melhor que sua experiência mostrou ser desejável. Esse alvo é o seu ídolo e, portanto, deve ser abandonado.

– Vejo o que está querendo dizer — replicou a mulher, embora não visse nada.

– Sim, acredito que esteja certo. Muito certo, na verdade. Seu ponto é revolucionário. Preciso encontrar um caminho espiritual. Meu alvo deve ser Deus e meu método, a obediência. E a oração. Sim, devo fazer o que é certo e confiar a Deus os resultados. Está dizendo exatamente o que acabei de ouvir de uma mulher sábia, mais idosa, em minha igreja. Foi muito interessante.

– Ela disse a verdade, mas você não ouviu. Foi por isso que vim.

– Bem, penso que ouvi o que ela tinha a dizer. —A mulher estava mais indignada do que desanimada. — Agradeço por ter vindo reforçar a mensagem dela. Vamos ver. Sim, me lembro. Ela disse que eu estava me esforçando para compreender e viver pelo princípio da seqüência. Sabe, a idéia de que B segue-se a A, de modo que se eu quiser B, devo descobrir o A que fará isso acontecer. Ela estava totalmente certa. Quero saber o que deve ser feito para mudar minha vida para melhor e me manter longe de problemas no futuro. Disse, também, que em vez de me esforçar tanto, devo aprender a orar. Novamente, tinha razão. E claro que continuo tendo de obedecer, mas desde minha conversa com ela, estou orando muito mais.

– Por que você ora? –

– Um ar gelado varreu repentinamente o quarto. A mulher procurou defender-se dele.

– Por que oro? Que pergunta estranha. Estou certa de que sabe os ensinamentos: peça e receberá; agarre-se a Deus e não deixe que se vá até que o abençoe; importune, se necessário, até obter uma resposta; não aceite menos do que todas as bênçãos que ele reservou para você.

– Esse é o antigo caminho.

A mulher franziu a testa. A voz não conhecia os ensinamentos do Livro Sagrado? Um pensamento amedrontador cruzou então sua mente. A pessoa por trás da voz talvez soubesse os Ensinamentos, mas não cresse neles. Estaria conversando com um demônio? Um falso profeta? Uma serpente estaria no quarto com ela?

– Como pode ser isso? — respondeu ainda mais indignada. — Minha vida é difícil. E certo orar. Levo todos os meus problemas a Deus. Está, por acaso, querendo dizer que a oração é o antigo caminho?

– A oração não é o antigo caminho. A sua oração é que é.

A mulher começou a chorar. — Por que zomba de mim? Estou desesperada. Pensei que me mostraria um novo estilo de vida. O que fez até agora foi induzir-me a perder a pouca esperança que me restava.

– Seus desejos não estão ainda amadurecidos. Os pequenos afetos criam ídolos, deuses sem valor aos quais você sacrifica a sua vida. Suas orações destinam-se à adoração de ídolos. Você foi aprisionada pelo seu desejo de vida melhor, que define pelas suas experiências de prazer e dor. Vim mostrar-lhe o novo caminho que leva à melhor esperança.

As lágrimas da mulher se transformaram em soluços, e estes em queixumes.  – Só quero fazer o que é certo para receber as bênçãos de Deus. Há algum erro nisso? Por que não me diz o que devo fazer? — Se a voz viera de Deus, ela tinha a certeza de que seus lamentos o fariam apiedar-se e dizer-lhe o que fazer.

A voz disse: — Você quer saber o que é eficaz. Não pediu para saber o que é santo.

O choro da mulher diminuiu. São duas coisas diferentes?

– Sua busca por um caminho eficaz a uma vida melhor a levará a seguir os princípios básicos deste mundo e não os caminhos da santidade. Seguir esses princípios pode, às vezes, tornar sua vida mais agradável, mas jamais satisfará a sua alma. Nunca a levará à melhor esperança.

– Além do mais, sua determinação de fazer o que é eficaz é inútil, porque não tem soberania sobre nada. Não controla nada. O princípio da seqüência não garante nada.

– Está dizendo que nada que eu faça afeta o que acontece em minha vida? Que não tenho qualquer influência?

– A influência é real. Ela traz a alegria da responsabilidade e impacto. Mas controle sobre o que mais importa é uma ilusão. Agradeça por não ter nenhum.

A mulher começou a sentir-se diferente, como um neto que acabou de compreender que seu avô era sábio. Até este ponto seu diálogo com a voz tinha sido um debate. Agora começou a ouvir para aprender.

A voz continuou. — A ilusão de controlar as coisas tem suas exigências, as quais criam pressão que leva à escravidão, e esta, por sua vez, ao fato de se tentar imaginar o que é a vida para fazê-la funcionar. Os que se apegam à ilusão do controle perdem o prazer da liberdade.

– Não sei se entendi bem. Os bons pais não criam filhos bons? Os que ofertam fielmente não gozam da promessa da segurança financeira? As orações dos filhos de Deus não são sempre respondidas por seu Pai amoroso?

– Conforme a vontade do Senhor. Ele é soberano sobre tudo. Tenha cuidado para nunca exigir promessas que ele não fez. Os que cometem esse erro pensam que por agir certo obrigam o Senhor a abençoá-los segundo a sua compreensão da vida melhor.

A voz tornou-se então infinitamente amável. — Minha filha, você se deixou escravizar pela lei da linearidade, o que a mulher idosa e sábia chamou de princípio da seqüência. Ela a obriga a fazer o que é certo para ganhar as bênçãos que deseja. Essa lei não é mais a regra que guia os filhos de Deus. Ela já serviu o seu propósito. A conclusão é clara. Ao agir certo, ninguém pode ganhar a vida perfeita mais tarde, nem a vida melhor agora. Pela graça do Mestre, essa lei foi substituída pela lei da liberdade. Sob a lei da liberdade, você fica livre para viver no mistério da confiança.

– Você, porém, não aceitou a autoridade desta nova lei porque ela exige que desista da ilusão do controle. Você reduziu as exigências da santidade, supondo que possa fazer coisas suficientes para produzir a vida melhor. Isso, às vezes, dá certo, mas outras, não. Você vive, então, com incerteza e sob pressão e exige conhecer o modo de vida que fará sua vida funcionar como quer. Você manipula, mas não confia. Negocia e não adora. Analisa e interpreta para obter controle sobre o que acontece; mas não depende. Busca a vida melhor das bênçãos de Deus acima da melhor esperança da presença dele.

A mulher sentiu como se águas estivessem subindo acima da sua cabeça. — Mas eu quero que minha vida funcione. Tenho me sentido tão infeliz. Preciso saber o que estou fazendo de errado! Por favor, quer dizer-me o que devo fazer?

– Procure apenas a presença de Deus e saberá o que fazer. Isso encherá sua alma de alegria.

– Mas… só as bênçãos da sua presença me trarão a verdadeira alegria. Preciso saber como alcançá-las!

– Está errada. Você só precisa de Deus.

– Pensei que precisava de Deus porque só ele poderia tornar minha vida melhor.

– Quando o Mestre caminhou nesta terra, ele se afastou das pessoas que queriam usar seu poder para obter a vida melhor. Ele não se utilizará dos fracos de espírito. Existe uma esperança melhor do que acreditar que somente a vida seja melhor. O novo caminho a levará até ela.

Essas foram as últimas palavras ditas pela voz. No momento em que terminaram, a mulher perdeu a consciência. Ela reentrou no tempo.

O mostrador digital do relógio marcava 6h30. A manhã chegara. A mulher esfregou os olhos. A pergunta que fizera ao adormecer continuava presente ao enfrentar o novo dia, mas não parecia mais urgente. Ela continuava sem saber o que tornaria sua vida melhor, mas não mais parecia ter tamanha importância. Sentiu um desejo de algo que fosse maior do que as bênçãos da vida melhor. Mas nada do que eu fizer, disse a si mesma, fará com que ela aconteça.

Uma pressão que há longo tempo vinha pesando em sua alma estava desaparecendo. Sentiu-se mais leve, mais serena. Será isto o que procurei por tanto tempo?

Ela virou a cabeça para a janela para ver o sol da manhã. Ouviu nesse momento uma voz familiar sussurrando: — Está prestes a encontrar o novo caminho para viver. — Estranho, pensou. Era a voz de uma mulher idosa e sábia.

Este texto foi extraído da seguinte obra: Crabb, Larry – Chega de Regras (Mundo Cristão, São Paulo, 2003, pp. 11-17). Texto gentilmente cedido pela Edi¬tora Mundo Cristão.

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