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Uma Mulher Chamada Teresinha

Por: Elenir Eller Cordeiro

Simplicidade e Abnegação Trazem Luz e Milagres ao Sertão Nordestino

A primeira vez que eu e Flávia, minha companheira na viagem ao sertão do Nordeste em julho de 2006, vimos Teresinha em ação foi numa reunião de oração, pela manhã, com algumas mulheres. Quando entrei no salão da igreja em Santa Terezinha do Pernambuco, já senti que havia liberdade do Espírito no ambiente. Oravam em pé, andando de um lado para outro, orações fervorosas e simples. Fiquei encantada com o jeito de Teresinha orar: “Deus, revela a palavra para nós, restaura a igreja e as vidas”. Senti que ela tinha encargo genuíno pelas vidas da região. Pensei: “Ó Deus, como gostaria de trabalhar na tua obra junto com essa mulher”.

Depois da oração, ela começou a compartilhar como Deus tem dirigido a obra ali desde 1990. Simples e sábia, articula bem as palavras para se expressar – às vezes chora quando se emociona. Não levou muito tempo para constatarmos que, de fato, Deus havia separado a vida dela e de toda sua família para buscar vidas lá naquele sertão. Daria um livro, se tentássemos registrar tudo – uma seqüência maravilhosa de lutas e vitórias, aventuras e milagres.

Em alguns momentos, não me contive e chorei. Estava diante de uma gigante da fé, de uma intercessora e de uma discipuladora de mulheres – e de homens também. Deus estava usando uma família simples e disposta no sertão de Pernambuco e da Paraíba para praticar o evangelismo na base de confiança e comunhão. Como Deus os chamou e preparou para isso?

Conversão em Jundiaí – purgatório ou sangue de Jesus?

Tudo começou em 1976, quando esse casal de nordestinos, Teresinha e Sebastião, partiu da pequena cidade de Santa Terezinha do Pernambuco, que fica bem na divisa com Paraíba, assim como tantos outros nordestinos, em busca de uma vida melhor. Dentro de três meses após sua chegada em Jundiaí, SP, Teresinha (grávida de um mês), Sebastião e o filhinho Jonas, de três meses, foram morar, providencialmente, numa casa no bairro de Medeiros, ao lado da casa de Bete Marion (irmã do Pr. José Carlos Marion). Bete, com a ajuda dos missionários ingleses, Nice e Gordon Chown (tradutor da Bíblia Pentecostal), começou a visitar e a evangelizar o casal.

Personalidade forte, católica irredutível, Teresinha cria, sem pestanejar, que seria purificada de seus pecados somente no purgatório. Numa das suas visitas, Bete Marion a desafiou a achar um versículo na Bíblia que confirmasse tal doutrina. Convicta de que tal versículo existia, foi perguntar ao padre em que livro da Bíblia ela podia encontrar a explicação sobre o purgatório. “Ah, Teresinha, essa vou ficar te devendo!”, foi a resposta do padre.

Decepcionada, aceitou, só para satisfazer a nova amiga, o convite de Bete Marion para ir a um culto numa Igreja Batista em Jundiaí. Foi nesse dia que entendeu que só o sangue de Jesus pode purificar pecados. Aceitou o apelo da esposa do pastor e, dentro de pouco tempo, passou pelas águas do batismo e pelo fogo do Espírito Santo. A princípio, seu marido Sebastião resistiu ao evangelho, devido ao mau testemunho dos próprios cristãos daquela igreja; contudo, não pôde resistir ao amor de Deus demonstrado a ele e sua esposa pelos membros da família Marion. Assim nasceu, no reino de Deus, um casal de evangelistas, semelhante a Priscila e Áquila do Novo Testamento, cooperadores em Cristo Jesus e dispostos a sacrificar suas vidas em prol da igreja de Deus em Jundiaí e, mais tarde, no sertão do Nordeste.

Durante os anos seguintes, Teresinha revelou-se como evangelista eloqüente, mulher de fé e de compaixão pelas vidas. Evangelizou muitas famílias em Jundiaí e Itupeva, sempre apoiada por seu valoroso e observador esposo, o servo útil da parábola que não mede esforços para servir em tudo e a todos, sem pensar em sua própria saúde delicada. Nesse período, o casal fez várias visitas ao Nordeste onde viam, consternados, a carência do povo e a necessidade que havia da pregação do evangelho, principalmente entre seus parentes da região rural.

Uma congregação no meio do sertão – Cuidado com a “lei do cão”!

Em 1990, Teresinha e Sebastião abdicaram de todo o conforto que haviam conquistado em São Paulo e, em agosto daquele ano, foram ungidos missionários pelo Pr. José Carlos Marion e enviados para alcançar a zona rural do sertão de Santa Terezinha com o evangelho de Cristo. Partiram de Jundiaí, juntamente com os três filhos (Jonas, 15, Eliana, 14, e Jairo, 9) e, em setembro, já estavam morando na área rural, bem no meio do sertão. Mais tarde, já no campo missionário, nasceria o filho Lucas.

Escondido (nome bem apropriado!) é o nome do sítio que escolheram para se estabelecer, no município de Mãe D’água. O lugar fica a 18 quilômetros da cidade, mas as estradas estreitas e esburacadas por causa de erosões, invadidas por grandes lajes de pedras, abundantes na região, região de serra, fazem com que se gaste até uma hora para chegar lá de carro. Durante a viagem (recomendada somente para carros com tração nas quatro rodas), você passa por vários sítios, que são grandes áreas de 200 a 300 hectares de terra onde moram muitas famílias que vivem da agricultura de subsistência (principalmente, feijão de corda e milho) e da criação de caprinos. Morros cobertos de pedra, de todo tamanho e formato, predominam na paisagem. Não há rios, a água vem de açudes, de cisternas que coletam água da chuva e de minas. Escondido até hoje não possui energia nem água encanada.

Por conhecerem bem os costumes da região e a força do preconceito religioso, o casal, antes de sair de Jundiaí, comprara, por telefone, uma casa no Escondido, ao lado de uma Escola Primária que leva o nome do fundador, Antônio Alves de Lima (ex-coronel da política, ex-proprietário da casa e cunhado de Teresinha). Sabiam que se não fossem donos de uma propriedade na região, logo seriam expulsos como já havia acontecido antes com um missionário.

No dia 15 de setembro, fizeram a primeira reunião evangelística em sua residência. Presentes, várias famílias que haviam aceitado o convite, feito pessoalmente por Teresinha, para tomarem um “chá” em sua casa. Além de chá, preparou café, suco e cuscuz de milho para servir aos vizinhos que, em sua maioria, tiveram que sentar no chão da sala, pois não havia cadeiras suficientes para todos. Antes de servir, deu uma palavra, explicando por que estavam ali, sua missão e desejo de compartilhar a salvação em Jesus Cristo.

A reunião virou um pequeno debate, com algumas pessoas se manifestando contra seu objetivo e dizendo que Teresinha e sua família sofreriam o castigo de Frei Damião e de Padre Cícero, personagens veneradas e idolatradas no Nordeste. “Tive que agir com muito amor e muita sabedoria de Deus para que a primeira reunião não virasse um fiasco e eles nunca mais retornassem”, conta Teresinha.

As reuniões continuaram, com maior aceitação das famílias dos outros sítios – Santo Antônio, Barriguda, Matinha (onde reside grande parte de seus parentes), Olho D’água, Deserto, Viração, Sótão, Cafundó. As famílias do Escondido eram mais resistentes e começaram a persegui-los com falatórios e calúnias. O padre alertava os fiéis para que não dessem ouvido à pregação de Teresinha, pois aquilo era a “lei do cão”.

Desde o início, Deus deu a Teresinha e Sebastião uma estratégia eficaz de evangelismo. Quando sentiam amor e preocupação por uma família, começavam a visitá-la até que fosse estabelecido um relacionamento de confiança. Só então começavam a pregar a Palavra, realizando, assim, um evangelismo na base de comunhão e de confiança.

De forma natural, as primeiras conversões começaram a acontecer e, segundo Teresinha, mais de 100 pessoas se reuniam no pequeno salão que foi construído para os crentes do Escondido. Sua convicção na Palavra e a compaixão pelas vidas faziam com que famílias inteiras, vindas dos mais diferentes sítios, caminhassem mais de uma hora para participar das reuniões que aconteciam aos domingos, das 14h às 16h. Ali, naquele pequeno salão, no meio do sertão, durante quatro anos, muitos se prostraram aos pés de Jesus, foram batizados no Espírito Santo e curados de enfermidades do corpo e da alma. Foi uma obra pioneira de evangelismo no meio rural, com classes de estudo bíblico para crianças e adultos. Muitos que ali se converteram acabaram mudando para São Paulo (algo muito comum em todo o Nordeste) e espalhando a semente para outros lugares.

Tentação no Sítio do Escondido

Não foi sem luta que tal vitória foi alcançada. Como ocorre muitas vezes com aqueles que são chamados pelo Senhor, houve um momento em que parecia que não daria mais para continuar.

Teresinha e seu filho Jairo me levaram para conhecer o local exato em que ela enfrentou sua crise. Assim que chegamos lá, antes de entrar na casa onde morara, Teresinha me levou para trás do antigo local de reuniões, agora em ruínas, bem perto da estrada. Foi nesse lugar, no penúltimo dia do ano de 1990, que ela, em pé, encostada na parede de tijolos à vista, aos prantos, derramou a angústia de sua alma diante de Deus. Foi ali que Deus lhe deu uma experiência que se tornaria o divisor de águas no seu ministério no Nordeste. Vê-la encostada novamente naquela parede, contando a experiência que tivera há quase 16 anos, olhando para os montes cobertos de pedras e relembrando como clamara diante de Deus, foi uma experiência comovente. Muito emocionada, deu seu testemunho para que eu gravasse:

No dia 30 de dezembro de 1990, eu estava sozinha neste sítio e comecei a lembrar a fartura em São Paulo, que não tínhamos mais aqui. Desejei ter nas mãos um copo de limonada bem gelada. Eu quase podia ver o suor gelado escorrendo pelo copo. Pensei em frango assado, maionese, tudo de bom que tínhamos quando morávamos lá. Aquele foi um momento de “tentação do inimigo”. Angustiada, eu vim aqui e, encostada nesta parede, olhei para o céu e comecei a chorar e a gritar. Logo, Deus falou comigo: “Vai para dentro que vou falar contigo na Palavra”. Imediatamente, senti paz em meu coração. Dentro de casa, abri a Bíblia, e Deus falou comigo em João l5.16: Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda. Aquelas palavras ficaram gravadas em meu coração e foi em cima delas que edifiquei meu ministério. Viesse a luta que viesse, eu nunca iria desistir porque sabia que foi o Senhor que me escolhera e enviara. Minha vitória ia depender de minha fidelidade a Deus. Se fosse fiel e cumprisse o ide de Jesus, eu sabia que ele estaria sempre comigo. Desde então, não importa o que tenho de passar, posso ser fiel porque ele é fiel. Tenho crido na Palavra de Deus que diz que muito maior é a glória que há de se revelar em nós do que a aflição que passamos.

Ela contou a experiência com tanta convicção e unção que não pude duvidar de que Deus falara, de fato, com ela. Desde aquele dia, decidiu que nunca mais reclamaria ou murmuraria; passasse o que tivesse que passar, confiaria em que Deus não a desampararia nem a sua família.

Jesus multiplica o pão no Escondido

Aos domingos, as famílias que moravam longe tinham o costume de chegar bem cedo na casa de Teresinha para evitar o sol escaldante. “Lá pelas dez horas da manhã, da minha casa eu olhava para as trilhas de pedra no morro e via as famílias, adultos, jovens e crianças, vindo em fila indiana. E eu pensava: ‘Lá vem o formigueiro de Jesus’”, conta Teresinha emocionada.

Ela sentia verdadeira alegria em recebê-los e preparar-lhes almoço antes da reunião. Mas isso também gerava apreensão e até dor de cabeça, porque muitas vezes sabia que não havia comida suficiente para alimentar cerca de 60 pessoas. O único jeito era colocar os panelões (que eram emprestados, juntamente com os pratos e talheres, da escola rural ao lado) no fogo para cozinhar as poucas xícaras de arroz e feijão disponíveis e, enquanto o alimento cozinhava, orava e intercedia muito para que não faltasse comida. Algumas irmãs que freqüentaram aquelas reuniões do Escondido testemunham que sabiam quando a comida estava escassa. Era só olhar para Teresinha e vê-la batendo as panelas, cantando e intercedendo baixinho, que já se podia perceber: “a coisa hoje não tá fácil”.

No dia em que estive com ela naquela propriedade, fazia dez anos que Teresinha estivera ali pela última vez. Estava visivelmente comovida. Mais uma vez ela testemunhou, enquanto me mostrava o interior da casa, como muitas vezes Jesus multiplicara o pão:

O Senhor nunca me deixou envergonhada. Muitas vezes, Jesus multiplicou o pão no Escondido aqui nesta cozinha. Na hora do almoço, as pessoas se enfileiravam na sala, pratos e garfos na mão, entoando cânticos de louvor, agradecendo a Deus pela refeição, e adentravam a cozinha, passando diante dos panelões de comida (geralmente, arroz, feijão e cuscuz – um franguinho, só quando possível), enquanto eu, em intercessão silenciosa diante do Pai, com a ajuda de outras irmãs, enchia os pratos de cada um, sem economizar na quantidade. Foi aqui, neste lugar, que Deus, por várias vezes, multiplicou o nosso pão.

Quando me contaram isso em Jundiaí, fiquei meio incrédula, mas, naquele momento, tendo observado, por alguns dias, a vida daquela mulher, não pude deixar de crer. Era verdade, de forma naturalmente sobrenatural, Deus alimentara seu pequeno rebanho do Escondido com algumas xícaras de arroz, de feijão e um pouco de cuscuz. O milagre da multiplicação do pão ocorrera no sertão.

Começando na Cidade

Em 1994, a saúde de seu esposo Sebastião se agravou. A cartilagem de sua perna direita era fraca, desde seu nascimento. As subidas e descidas naquele lugar montanhoso, as muitas idas a pé para a cidade só fizeram piorar o problema. Foi preciso voltarem para Jundiaí para tratamento, onde ficaram por um ano e quatro meses.

Quando retornaram para o sertão, em 1996, foram dirigidos pelo Senhor a se estabelecerem na cidade de Santa Terezinha do Pernambuco. Muitas famílias dos sítios, que se reuniam com eles no Escondido, mudaram para a cidade e freqüentam a igreja de Terezinha e Sebastião. Todo o domingo à noite, após as reuniões, Teresinha serve em sua casa um sopão de legumes com macarrão para as famílias do sítio. Ela faz questão disso; do contrário, vão chegar em casa e comer arroz e feijão frios, pois é muito tarde para acender o fogão de lenha. É bonito de se ver. Comer na casa de Terezinha é sentir um gostinho de igreja de Atos, porque as refeições são feitas com singeleza de coração e muita comunhão. A cada refeição que eu e Flávia tivemos ali, saímos com o corpo e o espírito bem alimentados.

Ali, junto daquela família, aprendemos lições preciosas de abnegação e dedicação. A casa deles estava sempre cheia. Pessoas entrando e saindo para resolver algum problema, usar o telefone (praticamente o único disponível entre os irmãos), pedir oração e conselho. Ali eu digo que vi pessoas que dão tudo para Jesus. Teresinha trata cada um que chega, desde o mais importante até o mais simples e humilde, como alguém especial, esbanjando carinho e amor divinos.

E os frutos da transformação estão evidentes. Como ela testemunha:

É maravilhoso ver as pessoas se converterem e mudarem de vida. Tenho visto famílias cujas casas pareciam um chiqueiro e, hoje, graças à luz do evangelho, possuem casa própria, simples mas limpa, e uma vida abundante.

Recentemente, perguntei a ela, por telefone, como resumiria sua visão e que mensagem gostaria de deixar para os leitores da revista. Seu desejo é alcançar outras cidades e povoados com a pregação da Palavra. Gostaria de poder equipar e enviar missionários para outros lugares dentro do Brasil e fora também. Este é o recado que ela deixou para aqueles que Deus têm chamado para a obra:

Não fiquem com medo de corresponder ao chamado de Deus.
Ele é um patrão fiel que cuida de cada necessidade. Não temam por seus filhos, achando que vão ser prejudicados. Em 1992, ainda no Escondido, debaixo de vários cajueiros, estava andando e orando, muito preocupada com meus três primeiros filhos sem escola. De repente, Deus falou comigo: Cuida das minhas coisas que eu cuidarei das tuas. Mesmo tendo que interromper seus estudos por alguns anos, Deus deu vitória para eles. Jairo faz faculdade de Direito em Patos, e os outros dois, que estão em SP, vão para a faculdade neste ano de 2007. Deus tem levantado pessoas e recursos para que meus filhos se realizem tanto profissional como intelectualmente. Ele, de fato, cuidou dos meus.

Elenir Eller Cordeiro, antes parte da equipe da Escola Cristã de Jundiaí, está se estabelecendo, desde março de 2007, em Santa Terezinha do Pernambuco e se integrando na comunidade descrita acima.

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