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Série “Preparando a Família” – Parte 7 – A Família no Período da Igreja

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Por: Pedro Arruda

Convencionalmente, dá-se como o início da Igreja o dia da primeira Festa de Pentecostes posterior à ressurreição de Jesus. Naquela ocasião, o Espírito Santo explicou, por intermédio de Pedro, que a profecia estava-se cumprindo: Mas isto é o que foi dito pelo profeta Joel: E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do meu Espírito derramarei sobre toda a carne; e os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, os vossos jovens terão visões, e os vossos velhos terão sonhos; e também do meu Espírito derramarei sobre os meus servos e as minhas servas, naqueles dias, e profetizarão; e farei aparecer prodígios em cima no céu e sinais em baixo na terra: sangue, fogo e vapor de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes de chegar o grande e glorioso dia do Senhor; e acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo” (At 2.16-21).

Duas características do tempo da Igreja

Observando com atenção, nota-se que esse texto não se refere apenas ao início da Igreja, mas a todo o período de sua existência (denominado últimos dias), que só se encerrará com a volta de Cristo – o glorioso dia do Senhor! Assim sendo, a ocorrência do derramamento do Espírito não se limitaria ao ato inaugural apenas. Seria, pelo contrário, uma característica desse período, como se pode ver já nos primeiros anos registrados no livro de Atos. Houve recorrências da vinda do Espírito em várias ocasiões, sempre ligadas ao início da presença da igreja numa localidade ou à introdução de alguém para fazer parte dela. Portanto, o batismo no Espírito Santo e a decorrente manifestação dos dons nunca teriam sido uma novidade em épocas posteriores se a Igreja tivesse prosseguido em seu curso normal.

Entretanto, não foi apenas essa característica, citada na passagem de Joel, que a Igreja perdeu ao longo de sua história. Com o devido cuidado para não alterar o conteúdo da profecia, poderíamos parafraseá-la da seguinte maneira: “Pais, vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões e vossos velhos terão sonhos; e, também, do meu Espírito derramarei sobre meus servos e minhas servas naqueles dias, e profetizarão…”. Observando os termos grifados nessa paráfrase, podemos notar que o contexto claro é de família, começando pelo núcleo (filhos e filhas) e estendendo-se a toda a casa patriarcal, na qual se incluíam outros agregados por diversos motivos: jovens, velhos (avós) e serviçais.

Se não reduzirmos esse texto apenas ao evento de inauguração, mas o entendermos como uma descrição da ação do Espírito Santo durante todo o período da Igreja, concluiremos que a família foi projetada como a principal receptora dessa graça e, consequentemente, como a transmissora dela. Infelizmente, com o passar do tempo, a Igreja foi abandonando essas duas características – a manifestação do Espírito Santo dentro da estrutura fundamental da família – até, finalmente, relegá-las ao evento inaugural.

De acordo com o desígnio de Deus, então, o período da Igreja seria marcado em toda a sua extensão pelo derramamento do Espírito Santo, fazendo cumprir inúmeras promessas do Antigo Testamento e capacitando o homem a praticar o Evangelho. Foi sobre isso que profetizaram Jeremias e Ezequiel muito antes quando disseram que o Espírito de Deus seria colocado no interior de cada pessoa e que seria feita uma troca do coração do homem. No lugar do coração de pedra, haveria um novo coração de carne com a lei escrita nele de tal forma que todos os homens, tornando-se obedientes, agiriam como se tivessem um só coração. Tudo isso é o que foi prometido para o tempo do Espírito ou da Igreja, que é a era atual.

No entanto, a profecia de Joel não fala apenas sobre o Espírito Santo, mas inclui, também, a família e, por isso, foi ela a escolhida para ser a voz profética (profetizar, ter visões, etc.) no dia de Pentecostes. É por meio dessa ação do Espírito dentro da família que se dará o cumprimento da promessa feita a Abrão de abençoar, por sua descendência, todas as famílias da Terra. Com a Igreja, inaugura-se um novo estilo de vida para as famílias que desejam inserir-se na bênção de Abraão.

Em seu momento inicial – nos primeiros 150 anos de sua história –, a igreja se reunia nos lares, não por motivos de doutrina ou estrutura, mas porque as pessoas tinham prazer de estar juntas para compartilhar o que mais tinham em comum: a vida de Jesus em cada uma delas. Ao que tudo indica, essa espontaneidade foi aos poucos sendo ofuscada por aspectos litúrgicos e, durante os 150 anos seguintes, algumas residências foram desocupadas pelas famílias cristãs que antes hospedavam as reuniões para abrir mais espaço e, assim, tornar-se o local oficial em que a comunidade se encontrava para o serviço religioso. Com isso, a motivação para reunir-se foi migrando do estilo de vida familiar para um padrão cada vez mais litúrgico. A família ficava progressivamente menos evidente e mais dispensável.

Passados pouco mais de 300 anos depois daquele dia de Pentecostes inaugural, a Igreja começa a construir suas primeiras basílicas – edifícios projetados para a realização da liturgia do serviço religioso. Como esse movimento foi feito de maneira muito lenta de uma geração à outra, as pessoas não tinham consciência das mudanças que estavam em curso. O que estava ocorrendo, porém, era que, à medida que a igreja afastava-se da família e da espontaneidade, ela também se afastava da experiência pentecostal.

Terminologia da Igreja – terminologia da família

Observando o livro de Atos dos Apóstolos, vemos que a terminologia empregada para explicar o relacionamento entre os cristãos foi emprestada do contexto familiar. Como todos se viam dentro de uma grande família, filhos de um mesmo Pai, tendo Jesus Cristo como irmão mais velho, era natural que se considerassem irmãos e que usassem esse termo para referir-se uns aos outros. Aqueles que se destacavam eram chamados de anciãos ou presbíteros, por exercer certa paternidade junto à comunidade que consideravam como sua família ampliada. Daí surgirem termos como patriarca, padre e papa que se assemelham a pai ou papai.

Vincent Branick lembra que Paulo usa os termos adelphos (irmãos) e adelphe (irmã) 119 vezes para referir-se aos membros da igreja. Para as comunidades, descreve a si mesmo como pai (1 Ts 2.11, 1 Co 4.14-15) e como mãe grávida (Gl 4.19; 1 Ts 2.7), e considera Onésimo e Timóteo como filhos (Fm 10; Fp 2.22). Inúmeras vezes, usa palavras derivadas de oikos, que designa casa em grego: edificar (oikodome) a comunidade (1 Ts 5.11; 1 Co 8.1-10; 10.23; 14.3-5,12,17,26; Rm 14.19; 15.2); família (oikenoi) na fé (Gl 6.10); ser administrador (oikonomos) dos mistérios de Deus, empenhado na administração (oikonomia) do Evangelho (1 Co 4.1-2). Todos esses termos foram tomados da área de negócios da família.[1]

Foi considerável o apoio operacional que as famílias deram às missões no período apostólico, compatível com a hospitalidade ensinada por Jesus. Por certo, a migração de um cristão com sua família, por qualquer motivo, também significava uma prática missionária. Houve muitos lugares aos quais o cristianismo chegou por meio de famílias de cristãos anônimos, antes dos missionários, incumbidos dessa tarefa como atividade principal. Um exemplo disso foi a disseminação do cristianismo para vários lugares como consequência da perseguição sofrida pela igreja em Jerusalém, ainda no primeiro século.

Portanto, a igreja abrigava-se dentro da instituição familiar, determinando o estilo de vida de tais famílias. A primeira divisão da Igreja ocorreu, na verdade, quando ela se emancipou da família para constituir-se numa instituição própria. Inconscientemente, passou a concorrer com a família, causando um dilema aos cristãos que, muitas vezes, tinham de optar entre uma e outra instituição, considerando aqueles que faziam a opção pela família como inferiores aos chamados vocacionados, que priorizavam a instituição eclesiástica.

Gosto muito da comparação entre ostras e famílias. Existem muitas ostras, mas nem todas contêm pérolas; da mesma forma, somente algumas famílias recebem o Evangelho e abrigam a igreja em seu seio. Toda família é um vaso, mas aquelas que abrigam a igreja são vasos com flores. A família foi criada para receber a igreja. Assim como houve uma família constituída por Deus para receber Jesus, o Cordeiro morto antes da fundação do mundo, em sua encarnação, podemos dizer que há famílias hoje que foram chamadas e constituídas para receber e abrigar o Espírito Santo, para se tornarem a igreja dos últimos dias.

A pregação de Pedro naquele dia de Pentecostes não pode ser considerada apenas um discurso que fazia parte do show de inauguração; pelo contrário, era um alerta anunciando que dali em diante, e até a volta de Cristo, as coisas seriam desta forma: o Espírito Santo seria continuamente derramado como um vinho novo a ser recebido pelas famílias na condição de odres novos.

Não tivesse a Igreja se afastado da família e dos carismas espirituais, teríamos um cenário diferente do cristianismo nos dias de hoje, bem parecido com o da primeira igreja apostólica.

Contudo, o período dos últimos dias ainda não se findou – há tempo de voltarmos ao propósito original!

Pedro Arruda faz parte do Conselho Editorial da revista Impacto, e é um dos coordenadores de uma comunhão de grupos espalhados por várias cidades e estados do Brasil. Ele reside em Barueri, SP, é casado com Clélia e tem três filhos casados.


[1] Vincent Branick, A Igreja Doméstica nos Escritos de Paulo, pág 14-15, (Ed. Paulus, 1994).

 

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Uma resposta

  1. Desde 1982, leio material publicado por voces, fico muito tocada com todas as mensagens e alegre em saber que nunca desviaram do foco, creio que a família é o plano original de Deus e que através delas Deus manifestará sua gloria.

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