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Mudança das Regras sobre Vocação Ministerial

Por: Harold Walker

De onde vieram os pastores, pregadores e missionários que exercem seus ministérios hoje? Como foi que escolheram essa vocação ao invés de serem médicos, advogados, engenheiros ou professores? Não acredito que tenha sido segundo o critério que ouvi de um pregador a respeito de um pai que tinha vários filhos: “O meu filho mais velho vai ser médico, o segundo vai ser engenheiro, o terceiro, advogado e o quarto… Já que não consegue mais nada, será pastor!”

Talvez, a grande maioria dos ministros atuais possa traçar o início de sua vocação a partir de um momento especial na juventude durante uma reunião em que a palavra foi ungida, o Espírito tocou seu coração profundamente num apelo apaixonado e houve uma decisão de dedicar sua vida totalmente a Deus. Após esse tsunami espiritual e emocional, quando tudo se aquietou, e eles começaram a pensar sobre como transformar esse desejo em prática, decidiram ingressar num seminário teológico e, após alguns anos, tornaram-se ministros com dedicação de tempo integral.

Quando me refiro a esse tipo de ministro atual, estou falando sobre os mais velhos, de mais de 50 anos de idade. Não acredito que os ministros mais novos tenham encontrado seu chamado dessa forma. Não conheço estatísticas sobre esse assunto, mas penso que muitos dos pastores mais novos não passaram por um seminário teológico de vários anos. Gostaria de pensar que também escolheram sua vocação por causa de um forte chamado do Espírito, mas, infelizmente, acho que muitos ingressaram num curso de obreiros, sentiram ter potencial, gostaram da sensação de estar à frente de um povo e de receber elogios e fama, e estão no ministério mais por causa dessas motivações do que por um chamado genuíno do Senhor.

De qualquer forma, as qualidades exigidas de um pastor, em muitas igrejas de sucesso atuais, giram muito mais em torno de carisma, habilidades interpessoais, eloquência no púlpito, capacidade de administrar e arrecadar ofertas do que de profundidade teológica ou experiência real com Deus. Mas não é sobre isso que falaremos aqui.

Dois aspectos de mudança de regras na vocação ministerial

Nosso assunto agora é a mudança de regras na escolha da vocação ministerial. Uma coisa é certa: o Espírito continua chamando jovens e adolescentes para se entregarem totalmente a ele. Nisso, não há mudança e, se houver, será no sentido de chamar maiores números de pessoas e com mais urgência por causa da grande colheita que virá antes da volta do nosso Senhor Jesus.

Creio que as mudanças maiores estejam em duas áreas principais: na questão da formação teológica e na questão da dedicação integral ao ministério. Ou seja, quando o jovem se entrega de corpo e alma ao Senhor, ele não precisa necessariamente estudar por quatro anos num seminário, nem tampouco se tornar um pastor de tempo integral ou um missionário transcultural. Existem, hoje, muito mais opções para se preparar e exercer uma vocação dedicada ao Senhor e à sua obra.

Cada vez mais, as pessoas estão entendendo que todos são sacerdotes, e que os ministros não são mediadores entre os cristãos e Deus. O modelo de um pastor profissional que é pago para administrar o salão de reuniões, visitar os membros, presidir as cerimônias religiosas e oficiar casamentos e velórios está ficando cada vez mais restrito às instituições mais históricas. Apesar de o sacerdócio de todos os cristãos ser uma das verdades centrais da Reforma Protestante, para muitos, tem demorado mais de 500 anos para cair a ficha sobre as implicações disso na vida cotidiana da igreja. Milhões de cristãos hoje acreditam na visão bíblica de que os presbíteros ou pastores da igreja não fazem parte de uma casta especial, o clero, e sim são apenas irmãos mais velhos chamados para nutrir e cuidar dos irmãos mais novos.

Dentro desse conceito, os pastores não precisam exercer o ministério de tempo integral. Podem e, muitas vezes devem, trabalhar em uma profissão secular. Fazendo assim, eles têm muito mais condições para entender os problemas dos irmãos e aconselhá-los. E, no final das contas, para o cristão neotestamentário, nada é secular – tudo é sagrado. “Tudo quanto fizerdes por palavras ou por obras, fazei-o em nome do Senhor Jesus…” (Cl 3.17).

Se o ministério for entendido dessa maneira, o jovem que é chamado para pastorear o rebanho, muito mais do que ir para um seminário, precisa ser discipulado em seu caráter por alguém mais maduro. Precisa achar uma profissão que, além de não o impedir de exercer seu ministério, contribua com ele. Precisa achar uma esposa que entenda sua vocação e o ajude a desempenhá-la. E precisa aprofundar-se na compreensão da Palavra por meio de cursos intensivos e dedicação diária à leitura, meditação e prática de oração intensiva, tanto individual quanto coletiva.

Por outro lado, se ele é chamado para ser um missionário transcultural, além das necessidades descritas acima, precisa fazer viagens missionárias de curta duração, ligar-se a ministérios mais maduros que tenham experiência nessa área, fazer cursos voltados a missões e aprender uma profissão que seja útil no país ou na região onde pretende trabalhar.

Resumindo, então, o que dissemos até agora: ao ouvir o chamado do Senhor para tornar-se um ministro do evangelho, o jovem hoje não precisa fazer quatro anos de seminário teológico, nem precisa ser sustentado pela igreja para dedicar-se de tempo integral ao ministério espiritual. As regras estão mudando! Precisamos atentar para isso!

O equilíbrio em relação ao ministério espiritual de tempo integral

É muito bom entender tudo isso, mas não podemos terminar o artigo aqui! Em épocas de mudança de regras, existe grande perigo de ir a extremos, de jogar fora coisas provadas pelo tempo e investir tudo em novos modelos que não são equilibrados nem seguros.

Uma das grandes vantagens do novo cenário ministerial que se descortina diante de nossos olhos é que todos os ministros terão profissões e não dependerão da igreja para seu sustento. Isso acabará com o fantasma de pastores amargurados que se sentem presos às suas instituições. O Espírito quer levá-los a uma direção, mas a instituição que os sustenta não concorda; como não têm outro meio para sustentar a família, sentem-se impedidos de realizar a vontade de Deus.

Por outro lado, se todos estão envolvidos com suas profissões materiais, a obra de Deus sofrerá grandes perdas, e o ministério da Palavra e da oração se tornará superficial e vazio. O ministério espiritual ficará apenas com as sobras do tempo e da energia das pessoas, e isso o prejudicará seriamente.

Portanto, nosso desafio é achar o equilíbrio nesse assunto tão vital para a igreja e a obra do Senhor em nossos dias. Apesar da mudança de regras e de ambiente, existem alguns princípios que nunca poderão mudar e, para achá-los, precisamos nos voltar para a Palavra escrita.

Citaremos aqui apenas alguns exemplos do equilíbrio tão perfeito que a Bíblia nos apresenta sobre esse assunto:

Jesus, Deus encarnado, passou 30 anos sem se dedicar a um ministério “espiritual”. Ele praticava a profissão de carpinteiro que aprendera com seu pai terreno, José (ponto para os que defendem a necessidade de todos trabalharem “secularmente”). Porém, após seu batismo na água e no Espírito e do período de tentação no deserto, quando começou seu ministério de pregar, ensinar, curar, expulsar demônios, discutir com fariseus e escribas e discipular outros homens para fazer o mesmo, Jesus nunca mais trabalhou “secularmente”. De fato, ele mal tinha tempo para comer ou dormir (ponto para os que defendem a necessidade de dedicação integral às atividades “espirituais”)!

Muitos pastores e ministérios de tempo integral hoje quase não se dedicam à Palavra ou à oração. Seu tempo é tomado com afazeres ministeriais materiais – deveres de adminstração, pagamento de contas, problemas burocráticos, planejamento de projetos etc. Quando os doze apóstolos perceberam que, por causa do tempo ocupado com a tarefa de cuidar das necessidades das viúvas, corriam o perigo de ficar vazios espiritualmente, rapidamente se recusaram a fazer isso e escolheram sete homens para tal serviço (At 6.1-6).

(É verdade que dois dos sete, Estêvão e Filipe, estavam tão cheios do Espírito que também não ficaram no exercício desse serviço, mas saíram curando, pregando e expulsando demônios e até, no caso de Estêvão, sendo morto por amor a Cristo! Oxalá que isso acontecesse novamente em nossos dias! Que tivéssemos tantas pessoas tão cheias do Espírito, orando, pregando, ensinando e curando que quase não achássemos quem cuidasse das coisas administrativas!)

Paulo é um exemplo perfeito do equilíbrio entre trabalhar em uma profissão “secular” para o próprio sustento e dedicar-se integralmente ao ministério “espiritual”. Sempre que possível, ele trabalhava, fabricando tendas, a ponto de algumas vezes rejeitar ofertas das igrejas para o seu sustento e o de sua equipe (At 20.33-35; 1 Co 9.12,15-18). Outras vezes, quando o ministério “espiritual” exigia, ele se dedicava integralmente ao ministério da Palavra (At 18.2-5). Como é importante não ir para um extremo ou outro! Quando possível, devemos trabalhar para nos manter e ajudar outras pessoas, mas, quando o ministério exige, devemos ter sensibilidade e humildade e aceitar o sustento oferecido por outros para nos dedicar exclusivamente à Palavra e à oração.

Essa não era apenas a prática de Paulo, mas também o seu ensino. Em todas as igrejas que ele fundava, logo promovia o reconhecimento de presbíteros, pessoas um pouco mais maduras do que as outras, que tinham caráter aprovado, famílias exemplares e trabalhavam para o seu próprio sustento. Porém, ele exortou a Timóteo para que fossem bem remunerados os “presbíteros que governam bem… especialmente os que labutam na pregação e no ensino” (1 Tm 5.17,18).

Algumas observações finais:

1 – Apesar de todas as mudanças de regras, o ministério de dedicação integral à Palavra e à oração ainda é válido, necessário, vital.

2 – Na maioria dos casos, porém, o ministro deve ter uma profissão e ser capaz de se manter quando necessário.

3 – Os ministérios de pastor e de missionário geralmente devem ser acompanhados por uma atividade profissional, pois isso, além de não impedir o exercício do ministério, muitas vezes aumenta a sua eficácia. (Isso não significa que o pastor ou missionário não deva ser sustentado integralmente, e sim que ele pode exercer outras funções além das “espirituais”, como, por exemplo, administrar creches, escolas vocacionais, orfanatos, escolas bíblicas, projetos comunitários etc.)

4 – Em todos os casos, o mentoreamento dos vocacionados é de suma importância, pois a formação do caráter é tão importante quanto o aprimoramento dos talentos e dons ministeriais. Em especial, a atitude da pessoa em relação ao dinheiro pode construir ou destruir o seu ministério. Quer trabalhando “secularmente”, quer sendo sustentado integralmente, o obreiro precisa dar bom testemunho nessa área, de que não desperdiça nem dinheiro nem tempo e que não se entrega ao luxo ou à ambição.

5 – O aprofundamento na compreensão da Palavra e o estudo da teologia “viva” continuam sendo imprescindíveis para um ministério eficaz. Apesar de não ser mais necessário cursar quatro anos de um seminário teológico, é indispensável fazer cursos e seminários mais curtos. Acima de tudo, o obreiro nunca deve cessar de “cavar” na Palavra por meio de estudo intensivo para achar novos tesouros e aprender de outros mestres, atuais e do passado (pelos livros), para manter um bom estoque de riquezas em seu “armazém espiritual”.

6 – Em contraste com o passado, quando apenas os pastores eram sustentados pelas igrejas, existem várias outras atividades e ministérios que deveriam ser sustentados. Por exemplo, biblicamente, o sustento necessário para liberar a pessoa do trabalho secular é mais ligado às atividades de estudar e pregar a Palavra e à dedicação à oração. Precisamos ver muitas pessoas comissionadas por Deus para se tornarem “missionários de oração”, para levantarem e apoiarem casas de oração 24 horas por dia, sete dias por semana, pelo mundo afora. Precisamos deixar para trás a ideia egoísta de que a igreja só sustenta ministérios que ministrem a si mesma. A igreja não existe para si mesma, mas para o Senhor. Pode e deve sustentar ministérios pastorais, mas, muito mais do que isso, deve sustentar missionários que fazem a obra de Deus em outros lugares, e pessoas que exercem o ministério ao Senhor!

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3 respostas

  1. Irmão Harold que bomba! Acredito que essas verdades estão reverberando nos corações dos santos em todo o mundo. Sonho em ver esse corpo “bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte”.

  2. Amado Harold
    Tenho a sensação de que este artigo faz parte do desejo de Deus de mexer com antigas regras e certezas rígidas do passado.
    Quero me aprofundar na Palavra e achava que o correto seria dar continuidade aos estudos em um Seminário, mas agora, após essa leitura, vou orar!!!
    Forte Abraço
    Deus o abençoe. Ricardo Carvalho

  3. Citação – “De qualquer forma, as qualidades exigidas de um pastor, em muitas igrejas de sucesso atuais, giram muito mais em torno de carisma, habilidades interpessoais, eloquência no púlpito, capacidade de administrar e arrecadar ofertas do que de profundidade teológica ou experiência real com Deus”. Disse tudo!!! É por isso que cada vez mais temos visto a Igreja Evangélica desonrada no meio do povo!

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