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Por John Nelson Darby

Carta escrita em 1847 ao editor de um dos seus livros

Meu caro amigo e irmão em Jesus Cristo,

Deu-me muita satisfação ver sua tradução do meu livro. Tive o grato prazer em lê-la, ou melhor dizendo, em ter alguém que a lesse para mim naqueles momentos nos quais o Senhor nos diz, como disse aos apóstolos: “Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto” (Mc 6.31).

Mas não posso deixar de dizer-lhe, meu caro amigo, que o prazer que a aparência do seu trabalho me trouxe foi, em certa medida, abatido pela opinião demasiado favorável que você expressou a meu respeito no prefácio.

Antes que tivesse lido uma palavra sequer de sua tradução, presenteei um mui querido e sincero amigo com um exemplar, e ele mencionou o que você escreveu em seu prefácio louvando minha piedade. O texto produziu em meu amigo o mesmo efeito que viria a produzir em mim, mais tarde, quando o pude ler. Espero, entretanto, que você não leve a mal o que vou dizer a respeito do assunto, o que é fruto de uma experiência razoavelmente longa.

O orgulho é o maior de todos os males que nos afligem e, de todos os nossos inimigos, não apenas é o mais difícil de morrer, como também o que tem a morte mais lenta; mesmo os filhos deste mundo são capazes de discernir isto. Madame De Stael disse, em seu leito de morte: “Sabe qual é a última coisa que morre em uma pessoa? É o seu amor-próprio”. Deus abomina o orgulho mais do que qualquer coisa, pois o orgulho dá ao homem o lugar que pertence a Deus que está acima de tudo.

O orgulho interrompe a comunhão com Deus e atrai sua repreensão, pois “Deus resiste aos soberbos” (1 Pe 5.5). Ele irá destruir o nome do soberbo, pois nos é dito que “a altivez do homem será humilhada, e a altivez dos varões se abaterá, e só o Senhor será exaltado naquele dia” (Is 2.17).

Como você mesmo irá sentir, meu caro amigo, estou certo de que não há maior mal que uma pessoa possa fazer a outra do que louvá-la e alimentar seu orgulho. “O homem que lisonjeia a seu próximo arma uma rede aos seus passos” (Pv 29.5) e “a boca lisonjeira é causa de ruína” (Pv 26.28).

Você pode estar certo, além do mais, que nossa vista é muito curta para sermos capazes de julgar o grau de piedade de nosso irmão; não somos capazes de julgar corretamente sem a balança do santuário, e ela está nas mãos daquele que sonda o coração. Não julgue nada antes do tempo, até que o Senhor venha e torne manifestos os conselhos do coração e renda a cada um o devido louvor (1 Co 4.5). Até então, não julguemos nossos irmãos, seja para bem seja para mal, senão com a moderação que convém, e lembremo-nos de que o melhor e mais certo juízo é aquele que temos de nós mesmos quando consideramos aos outros melhores do que nós.

Se eu fosse lhe perguntar como sabe que sou “um dos mais avançados na carreira cristã e um eminente servo de Deus”, sem dúvida você iria ficar sem saber o que responder. Talvez você viesse a mencionar minhas obras publicadas; mas será que você não sabe, querido amigo e irmão – você que pode pregar um sermão edificante tanto quanto eu –, que os olhos vêem mais do que os pés alcançam? E que, infelizmente, nem sempre somos o que são os nossos sermões? “Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus, e não de nós” (2 Co 4.7).

Não lhe direi a opinião que tenho de mim mesmo, pois se o fizer, é provável que, enquanto o faça, procure minha própria glória e, enquanto estiver buscando minha própria glória, possa parecer humilde, o que não sou. Prefiro dizer-lhe o que o nosso Mestre pensa de mim – ele que sonda o coração e fala a verdade, que é “o Amém e a fiel Testemunha”, e que tem falado freqüentemente no mais íntimo do meu ser, pelo que lhe agradeço.

Creia-me, ele nunca me disse que sou um “eminente cristão e avançado nos caminhos da piedade”. Ao contrário, ele me diz bem claramente que se eu procurasse o meu próprio lugar, iria encontrá-lo como sendo o do maior dos pecadores, pelo menos dentre os que são santificados. E devo dar mais crédito ao julgamento que ele faz de mim, meu caro amigo, do que àquilo que você pensa a meu respeito.

O mais eminente cristão é um daqueles de quem nunca se ouviu falar, algum pobre trabalhador ou servo, para quem Cristo é tudo, e que faz tudo para ser visto por ele, e somente por ele. O primeiro deve ser o último.

Fiquemos convencidos, meu caro amigo, de louvar somente o Senhor. Só ele é digno de ser louvado, reverenciado e adorado. A sua bondade nunca é demasiadamente celebrada. O cântico dos abençoados (Apocalipse 5) não louva a ninguém senão “Aquele que os redimiu com o seu sangue”. Não há no cântico uma única palavra de louvor a qualquer dos redimidos – nenhuma palavra que diga que são eminentes, ou que não são eminentes –; todas as distinções estão perdidas no título comum, “os redimidos”, que expressa a alegria e glória de todo o Corpo.

Empenhemo-nos em trazer nossos corações em uníssono com aquele cântico, ao qual todos esperamos que nossas débeis vozes venham se unir. Esta será a razão da nossa alegria, mesmo enquanto estivermos aqui, e contribuirá para a glória de Deus, a qual é lesada pelo louvor que os cristãos freqüentemente prestam uns aos outros. Não podemos ter duas bocas – uma para louvar a Deus e outra para louvar o homem.

Possamos, então, conhecer o que os serafins fazem (Is 6.2,3), quando com duas asas cobrem suas faces, como um sinal de sua confusão diante da sagrada presença do Senhor; com outras duas asas cobrem seus pés, como se tentassem esconder de si mesmos os seus próprios passos; e com as duas asas restantes voam para executar a vontade do Senhor, enquanto proclamam: “Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos: toda a terra está cheia da sua glória”.

Perdoe-me por estas poucas linhas de exortação cristã, as quais, tenho certeza, irão, cedo ou tarde, tornar-se úteis para você, passando a fazer parte da sua própria experiência. Lembre-se de mim em suas orações, enquanto rogo para que a bênção do Senhor possa pousar sobre você e seu trabalho. Se você porventura vier a imprimir uma outra edição – como espero que aconteça – por gentileza, exclua as duas frases para as quais chamei sua atenção; e me chame simplesmente “um irmão e ministro no Senhor”. Isto já é honra bastante, e não é preciso mais.

John Nelson Darby, 1800-1882, foi uma das principais figuras do movimento na Inglaterra conhecido como “Plymouth Brethren” (ou “Irmãos Livres”; ou “Casas de Oração”, no Brasil) e é considerado pai da linha teológica chamada “dispensacionalismo”.

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